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[Nota: aspecto interessante sobre a aquisição da nacionalidade brasileira na primeira metade do século XX].
O habeas corpus nº 26.643/1937: um estudo de caso
Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy
pós-doutor pela Universidade de Boston, doutor e mestre em Direito pela PUC/SP, procurador da Fazenda Nacional.
Sumário: 1.Introdução. 2.A Petição Inicial e os Contornos do Problema. 3.Informações e Investigações. 4.Relatório e Votos. 5.Conclusões
1) Introdução
Em 1937 a Corte Suprema dos Estados Unidos do Brasil (como então se chamava o Supremo Tribunal Federal) julgou o Habeas Corpus nº 26.643, impetrado pelo advogado René Souza Aranha Lacazé em favor de Ernesto Gattai, sobre quem incidia ameaça de expulsão do país. O paciente fora acusado da prática de atividades subversivas. Era tido como comunista, perigoso à segurança pública; a situação ganhava dimensão dramática na medida em que o interessado era natural da Itália. Cuidava-se de tentativa de expulsão de estrangeiro reputado como nocivo à segurança nacional. Questão muito recorrente na década de 1930, a exemplo, entre outros, das expulsões que atingiram Olga Benário Prestes e Genny Gleiser. O problema radica em polarização ideológica que marcou aquela época, que se viu dividida em direita e esquerda, opondo integralistas e comunistas. Sobre as duas tendências pairava olimpicamente Getulio Vargas, que maquiavelicamente explorou a contradição que então se desenhava.
O pano de fundo do presente ensaio consiste em tentativa de avaliação do referido processo de habeas corpus, com o objetivo de vincular direito e política, especialmente apontando-se para a relatividade das certezas normativas. Também, a partir da filha de Ernesto Gattai, a memorialista Zélia Gattai, que dividiu a vida com Jorge Amado, tenta-se apreender a trajetória do paciente e de sua família. Inúmeros excertos são aqui reproduzidos, de fonte primária, o próprio processo de habeas corpus, encontrado no Arquivo do Supremo Tribunal Federal. Ajustes ortográficos foram feitos, para melhor entendimento do leitor contemporâneo.
(…)
Em seguida, o Ministro Armando de Alencar apreciou o mérito, admitindo curiosa figura em direito público, isto é, a nacionalidade tácita, confirmando concretamente a tese que deu os contornos à petição de Gattai:
"É fora de dúvida que a União compete; expulsar de seu território os estrangeiro nocivos ou perigosos a ordem publica e a segurança de suas instituições. Todavia, não o poderá ser, o Brasileiro nato, e aquele que tiver adquirido essa qualidade, pela naturalização validamente processada, e indireta ou tacitamente, por expressa disposição da lei. O paciente, em face da prova que produziu, não é aqui um estrangeiro, mas tacitamente Brasileiro. E tal acerto deriva dos documentos de fls. 49-50 – 8- 15 – 12 – 9 – 10 – 11 – 13 – 14, com que instruiu o pedido e pelos quais se comprovou que o paciente não tendo manifestado a intenção de conservar a nacionalidade de origem, aqui reside desde 1891, que é proprietário de um imóvel situado na capital de S. Paulo, adquirido por escritura de 13 de Setembro de 1923 (doc. fls. 15 ) devidamente inscrita, tendo aqui também contraído casamento, em 1º Outubro de 1904 (doc. 49 ), sendo sua mulher, nascida na Itália mas também aqui residente.QUE - tem filhos brasileiros, nascidos em 5-11-913 – fls. 12, - 919 – 908 (fls. 10 ) – 20/2/911 (fls. 11 ), - 4/8/916 (fls. 14 ), - inclusive o de nome Mario que é reservista do Exercito Nacional (doc. fls. 13 ). Diz o artigo 69 nº 5 da Constituição Federal de 1891, reformada em 1926, a que fazem remissão os artigos 106 e 115 letra c das Constituições Federais respectivamente em 16 de julho de 1934 e 10 de Novembro do corrente ano: -São cidadãos brasileiros: Os estrangeiros que possuírem bens imóveis no Brasil e forem casados com brasileira ou tiverem filhos brasileiros, contanto que, residam no Brasil, salvo si manifestarem a intenção de não mudar de nacionalidade. O citado artigo 115 letra c de Constituição ora vigente dispõe: São brasileiros:. c) – Os que adquiriram a nacionalidade brasileira nos termos do artigo 69 nº 4 e 5 da Constituição de 24 de Fevereiro de 1891.Não consta das informações prestadas a fls. Tenha o paciente perdido essa tácita qualidade de brasileiro nos termos do artigo 116 da ultima citada Constituição Federal (…)"
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